
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram a existência de racismo estrutural no Brasil e graves violações de direitos da população negra do país, especialmente nas áreas de saúde, educação, alimentação e segurança pública. 👉🏽 O tribunal também considerou que o governo deve tomar medidas para garantir políticas públicas a este grupo. A decisão foi por unanimidade. O julgamento faz parte da ação chamada “ADPF pelas Vidas Negras”, que cobra medidas contra o racismo. A ação foi apresentada em 2022 por partidos e movimentos sociais. Os votos começaram a ser apresentados no fim de novembro, mês da Consciência Negra. O relator Luiz Fux foi a favor do reconhecimento de que há um "estado de coisas inconstitucional" e de que o governo deve tomar medidas para promover a igualdade racial. O ministro Flávio Dino e a ministra Cármen Lúcia acompanharam o entendimento do relator. Veja os vídeos que estão em alta no g1 Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes reconheceram violações, mas discordaram da declaração de “estado de coisas inconstitucional”. Para eles, é preciso adotar medidas para garantir direitos. 🔎 Quando o STF declara um “estado de coisas inconstitucional”, reconhece que há violação grave e contínua de direitos humanos. Nesse caso, o tribunal pode obrigar o governo a agir e acompanhar a execução das medidas. Voto do relator Fux foi o primeiro a votar e reconheceu o “estado de coisas inconstitucional”. Ele defendeu que o governo revise o Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial ou crie um novo plano para combater o racismo institucional. O ministro sugeriu prazo de 12 meses para apresentar um cronograma com metas e indicadores, sob monitoramento do Conselho Nacional de Justiça. Entre as medidas propostas estão: ações de reparação e valorização da comunidade negra; revisão das regras de cotas para garantir eficácia; criação de protocolos em órgãos de segurança, serviços públicos e Ministério Público para melhorar o atendimento à população negra. O plano deve ser elaborado com participação de ministérios e sociedade civil. STF - Supremo Tribunal Federal Gustavo Moreno/STF Votos dos ministros Flávio Dino acompanhou o voto do relator e sugeriu capacitação de professores e agentes públicos. Ele citou o caso de policiais que invadiram uma escola infantil em São Paulo após reclamação sobre desenhos de matriz africana. Cristiano Zanin abriu divergência parcial. Ele reconheceu violações, mas rejeitou declarar “estado de coisas inconstitucional”. André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes seguiram a mesma linha. Esses ministros afirmaram que a declaração indicaria que o Estado mantém políticas para sustentar o racismo estrutural. Eles lembraram avanços desde a Constituição de 1988, como ações afirmativas. Alexandre de Moraes também comentou a invasão policial, chamando-a de “absurda”. Ele propôs dar prioridade a processos administrativos e inquéritos sobre racismo. A ministra Cármen Lúcia, que acompanhou integralmente o relator, citou obras de Emicida e Carolina Maria de Jesus. O ministro Edson Fachin também seguiu na mesma linha. Providências Os ministros formularam as propostas ao governo de forma conjunta. Decidiram que o governo deve, em 12 meses, revisar o Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial ou criar um novo plano para combater o racismo institucional com as seguintes diretrizes: combate ao racismo estrutural, especialmente no acesso à saúde e à segurança alimentar; valorização da memória e do papel das populações discriminadas na formação cultural do país; revisão dos procedimentos de acesso via cotas às oportunidades de educação e emprego. A ideia é formular ideias para evitar baixa efetividade da política; autoridades de Justiça, polícia e Ministério Público devem produzir protocolos de atuação e atendimento de pessoas negras; incentivo a projetos culturais com a presença de pessoas negras; na elaboração e revisões do plano deve haver consultas e audiências públicas com a participação da sociedade civil. O que diz o governo A Advocacia-Geral da União afirmou ao STF que o governo está comprometido com o combate ao racismo e pretende criar um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional. Ação O processo foi apresentado ao Supremo em maio de 2022. Assinam a ação sete partidos - Rede, PSB, PT, PDT, PCdoB, PSOL, PV - e a Coalizão Negra por Direitos. O grupo listou violações contra direitos à vida, à saúde e à alimentação digna. Em relação à vida, citou a chacina na comunidade do Jacarezinho, no Rio, em maio de 2021, argumentando que as investigações mostraram que parte das pessoas assassinadas não tinha ligação com investigações que justificaram a incursão da polícia. Sobre a saúde, citou dados da Fiocruz que apontam que as mulheres negras sofrem efeitos da discriminação - sendo mais propensas a ter um pré-natal inadequado, receberem menos orientações sobre complicações no parto, e terem mais chances de não ter um acompanhante. Quanto à alimentação citou pesquisa do IBGE que mostra maior incidência de insegurança alimentar entre a população negra. "A população negra brasileira vivência sistematicamente a negação destes direitos, sendo submetida a um processo de genocídio permanente decorrente das desigualdades sociais e raciais resultantes da ação e omissão do Estado brasileiro", afirma a ação. "As práticas violadoras dos direitos fundamentais produzidas pelo Estado brasileiro em detrimento da população negra são reiteradas, seja por ação ou inação, compreendem postura deliberada, ou ao menos, projetada para que a fruição dos direitos fundamentais se dê de maneira diferente e desigual entre pessoas brancas e não brancas neste país", completa. O pedido é de que a União elabore e implemente um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional e à Política de Morte à População Negra, no prazo de um ano. E que estados e municípios também adotem medidas para combater o problema. A ideia é que o combate ao racismo institucional envolva mudanças nas ações para reduzir a letalidade e violência policial contra a população negra, com treinamento para agentes de segurança sobre relações raciais. Além disso, o objetivo é ter políticas públicas para garantir o exercício dos direitos políticos da população negra, e de candidatos que os representem; e a proteção dos espaços de exercício de fé de religiões de matriz africana. Há ainda propostas para assegurar a segurança alimentar e nutricional deste segmento da população.
