Operação Escudo: MP arquiva investigação contra motoboy nu baleado por PMs

Published 1 hour ago
Source: g1.globo.com
Operação Escudo: MP arquiva investigação contra motoboy nu baleado por PMs

Exclusivo: câmeras corporais mostram PMs atirando em motoboy durante operação O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) arquivou na quarta-feira (17) a investigação contra o motoboy Evandro Alves da Silva pelos crimes de resistência e porte ilegal de arma de fogo. Ele foi baleado durante a Operação Escudo, deflagrada na Baixada Santista em 2023. O g1 e a GloboNews divulgaram com exclusividade as imagens das câmeras corporais dos PMs que registraram toda a ação (veja acima). Em agosto daquele ano, os policiais militares Daniel Pereira Noda, Carlos Vinicius Batista Bruno e Thiago Freitas da Silva invadiram um imóvel alugado por Evandro no Morro José Menino, em Santos, no litoral paulista. O local era usado como ponto de apoio para mototaxistas. Evandro estava nu e usava o banheiro quando foi atingido por disparos de calibre 12. Mesmo gravemente ferido, ele pulou pela janela e caiu de uma altura de cerca de sete metros nos fundos da casa. Na época, os policiais afirmaram que o motoboy estava armado e disseram ter apreendido um revólver sobre uma cama. No entanto, segundo o MP-SP, a versão foi desmentida após a análise das imagens das câmeras corporais. Uma pistola semiautomática foi colocada na cena do crime pelos policiais. Desde setembro, os policiais são investigados por tentativa de homicídio após denúncia apresentada pelo MP-SP. O g1 tenta localizar a defesa dos agentes. Ao determinar o arquivamento do inquérito contra Evandro, o promotor Fabio Perez Fernandez afirmou que ficou comprovado que ele “não estava armado, nem resistiu de qualquer forma, apenas fugiu da abordagem policial”. A esposa de Evandro, a advogada Anna Fernandes Marques, comemorou a decisão. Segundo ela, o arquivamento encerra um capítulo doloroso e abre espaço para um recomeço. Foram meses difíceis, marcados por medo, exposição e sofrimento, vividos por nossa família. Hoje, o sentimento que prevalece é o alívio, a gratidão pela vida e a possibilidade de seguir em frente com dignidade. Seguimos confiando na Justiça e aguardando a apuração completa e a responsabilização dos fatos no processo que ainda tramita contra os policiais envolvidos, para que a verdade seja integralmente esclarecida. 🔎 O que foi a Operação Escudo? Realizada na Baixada Santista, a operação começou em julho de 2023, após a morte do PM Patrick Bastos Reis, e resultou na morte de 28 suspeitos em supostos confrontos. A ação foi alvo de denúncias por órgãos de direitos humanos a partir de relatos de moradores sobre execuções, tortura e abordagens policiais violentas. Evandro qubrou a janela e caiu de uma altura de sete metros. Reprodução O dia dos tiros Cerca de seis meses antes da ação policial, Evandro decidiu oferecer o serviço de mototáxi no Morro José Menino. Para isso, alugou um pequeno imóvel — com sala, cozinha e banheiro — que funcionava como ponto de apoio e descanso para ele e outros motoboys. No dia do ocorrido, ele estava sozinho no local, com a porta trancada, e havia tirado a roupa para usar o banheiro quando três policiais militares do 5º Batalhão de Ações Especiais (Baep) chegaram. Um quarto integrante da equipe permaneceu na viatura. A equipe era formada pelos policiais: Sargento Thiago Freitas da Silva Soldado Daniel Pereira Noda Soldado Carlos Vinicius Batista Bruno Soldado Lucas Matias dos Santos "Quando eu sentei no vaso, meteram a mão na porta. Eram os policiais. Eles perguntaram: 'Quem que está aí? É o Evandro?' Eu achava que eram os motoboys. Quando eu abri a cortina, o policial estava com a calibre 12 apoiada na janela, e ele me deu um tiro. Eu levantei a mão, e ele disparou e pegou no meu peito", relembra Evandro. Em pânico, Evandro quebrou uma pequena janela do banheiro e pulou de uma altura de 7 metros. Sangrando e sem roupas, caiu de bruços nos fundos do imóvel. "Na hora, o ato não foi pensando em fugir. Pensei na minha esposa e na minha filha. Eu pensei: 'Elas não vão me ver no caixão com caixão lacrado'." Às 10h58, a câmera mostra apenas um casaco sobre a cama. Dois minutos depois, a pistola aparece no mesmo local. Montagem g1/Reprodução As imagens das câmeras mostram os PMs descendo da viatura, tentando forçar a porta e, em seguida, posicionando armas de grosso calibre na janela. Em segundos, efetuaram pelo menos seis disparos. Ao perceberem que Evandro havia pulado da janela, entraram no imóvel. Enquanto o motoboy agonizava de dor nos fundos da casa sob a mira da arma de um dos PMs, ele suplicava: "Pelo amor de Deus, chefe, me salva, eu não sou bandido, estão me confundindo". Pelas imagens, um dos agentes chegou a colocar uma luva e revistou o corpo de Evandro à procura de arma — que não foi encontrada. O resgate demorou: o Corpo de Bombeiros e o Samu chegaram 30 minutos depois dos disparos. Evandro foi socorrido em estado grave para a Santa Casa de Santos, onde ficou 45 dias internado — sendo 23 deles em coma. Evandro, de 45 anos, hoje trabalha como motoboy e mototaxista. Ele é casado com a advogada Anna Fernandes Marques há mais de 20 anos, com quem teve três filhos. Sequelas Evandro oferece serviço de mototáxi no Morro Menino José, em Santos. Reprodução A ação policial de 2023 deixou marcas físicas e emocionais em Evandro. Ele teve oito costelas fraturadas, perdeu o baço e um pedaço do pulmão — onde há uma bala alojada. "Hoje eu tenho muita falta de ar. Tenho umas crises que todo mundo fala para mim que é crise de pânico. Eu nunca tive isso, sempre treinei, sempre gostei de atividade física, andava de skate e surfava", compartilhou. Segundo o motoboy, os episódios costumam ocorrer quando ele cruza com viaturas policiais. "Se der para entrar em algum lugar antes, eu entro, para não ter que passar por perto deles."

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